‘Vivi as transfobias de Valentina’, diz atriz que interpreta garota trans em filme da Mostra de Cinema
Ela tem 17 anos e acaba de se mudar para uma pequena cidade do interior de Minas Gerais. Passaria por uma adaptação comum na vida de qualquer adolescente se não fosse por uma questão: na tentativa de evitar intimidações, Valentina, garota transexual, quer se matricular na nova escola com seu nome social.
Começa, assim, uma série de dilemas. Despreparada, a escola passa a exigir a assinatura do pai ausente da menina para que ela use seu nome no local, e os moradores da cidade passam a hostilizá-la e a submetem a agressões físicas e morais quando descobrem sua história.
O drama ilustrado no longa “Valentina”, em cartaz na 44ª Mostra Internacional de Cinema, é rotineiro para muitos jovens transgênero: apenas 0,02% estão em universidades e 72% não concluem o ensino médio, segundo dados do projeto Além do Arco-Íris, da AfroReggae. Emprego formal, então, é exceção para trans e travestis no Brasil.
“As transfobias cotidianas de Valetina eu vivi, e toda menina transexual sofre. Mas não se trata só de agressões físicas. Você não ser aceita em um lugar; o menino rir da sua cara; não respeitarem seu nome… tudo isso é uma agressão”, conta a youtuber Thiessa Woinbackk, 30, que estreia como atriz na Mostra.
Thiessa também cresceu em uma cidade pequena, Catalão, no interior de Goiás, e conta que vivenciou muito de sua personagem até se mudar para São Paulo –mas com alguns pontos dissonantes. “Valentina tem a mãe ao lado que eu nunca tive. E ela se entendeu mulher muito nova, eu demorei mais.”
A relação de Valentina com a mãe [interpretada por Guta Stresser] também é um ponto forte e preponderante do filme. Enquanto a menina encontra acolhimento na força feminina, ela é invalidada e desrespeitada pelo masculino. A mãe, mesmo simples e sem recursos, a ampara; o pai tem vergonha.
Para Thiessa, a luta da personagem para ser matriculada por seu nome social reflete a batalha real dessas pessoas por identidade. “A Anitta [cantora] não se chama Anitta, mas todo mundo respeita. Por que não fazer isso com pessoas trans? É tão simples. Não deveria nem ser uma questão. Mas o mundo ainda é tão retrógrado que a gente precisa falar sobre isso. Temos que normalizar.”
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Valentina. 44ª Mostra de Cinema. R$ 6, em mostraplay.mostra.org.
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